terça-feira, 15 de novembro de 2011

Está em crise por ser da sustentabilidade ?

Está em crise por ser da sustentabilidade ?

Existem situações que confesso não entender. Sempre ouço de quem atua na sustentabilidade que ela, a tal sustentabilidade, traz ganhos para o negócio.
Mas, ao mesmo tempo, vejo muitas outras dizendo que não conseguem fazer a estratégia de sustentabilidade avançar na empresa. Como é que algo que traz valor não avança ?
Isso me lembra um vídeo no qual, segundo informações ali postadas, foi desenvolvido pelo Unibanco pela O2, para ser usado internamente. Em um dado momento do filme, o Diretor de Marketing pergunta à “querida” (a assim chamada moça defensora da sustentabilidade): “sim, entendo… mas você poderia me dar um exemplo de como podemos fazer isso?”. E ela: “ha, assim é difícil… são tantas ações sustentabilizadoras e sustentabilizantes que fica difícil sustentabilizar  assim…” e, como se não bastasse, continua: “Que tal: vamos esfriar a camada de ozônio e acabar com a adversidade !!!!!”…
Triste hein ?
Esse filme (o qual realmente sugiro que todos vejam, com lente crítica, pois está nos passando diversas mensagens verdadeiras sobre nosso dia a dia na sustentabilidade) é um retrato, uma caricatura com tintas carregadas de nossa realidade. É uma crítica não apenas aos “insensíveis” mas principalmente à nós, os, …., os… o que mesmo somos ? Evangelizadores ? Crentes ? Coerentes ? Corretos ? Sonhadores ?
Ta aí… é assim como somos, os profissionais da sustentabilidade, vistos pela maioria. Um grupo de pessoas que sonha, um sonho bom, mas sonha. Isto porque no mundo real (delas) as coisas são diferentes.
Estão errados ? Talvez não.
Talvez o erro esteja nos que tentam convencer que a sustentabilidade é um “valor” (no plano da ética, da moral) com muito maior intensidade do que explicitar o quanto a sustentabilidade é um “valor” (no plano econômico financeiro).
Tenho discutido muito isso com meus sócios na Origami e com clientes. Por mais que eu, como pessoa, tenha meus valores (sejam eles alinhados ou não à sustentabilidade), dificilmente a agenda deste tema avançará a partir de uma ação apenas nesse campo. Isto porque valores, neste contexto, são escolhas que as pessoas fazem e, por serem escolhas, tomam tempo e pode ser que nunca determinados valores sejam de fato introjetados (temos que considerar esta possibilidade).
Como o tempo urge, afinal os impactos provocados pelas atividades econômicas à sociedade e ao meio-ambiente já provocaram danos suficientes e que não temos muito tempo para reverter a situação (será que o Rio Tietê ainda reviverá ? E caso viva, será que o pescador de Itú, que vivia do rio e já morreu, reviverá ?.. para o pescador de Itu, o jogo foi perdido).
Precisamos agir, e rápido. E é exatamente neste ponto que me pego questionando se o melhor caminho é apostar as fichas no mundo dos valores humanos. Não que não concorde com estes, que não os ache fundamentais para um novo modelo de relações sociais, mas a questão é que no âmbito empresarial poucos são os que se dispõe a seguir de fato por esta trilha. E enquanto ficamos em compasso de espera tentando converter incrédulos, o tempo passa e pouco fazemos.
Seria o caso então de nos perguntarmos: o que podemos fazer enquanto esta mudança nos valores não processa nas lideranças e nas pessoas em geral ? E aí é que o entra o pragmatismo dos valores econômico-financeiros e que a “querida” do filme não soube traduzir ao seu chefe.
Vamos combinar o seguinte: não há unanimidade, em nada. Portanto, precisamos atuar tanto no campo dos valores da ética e da moral como nos valores econômico-financeiros. São duas estratégias não excludentes e, para exemplificar o que estou dizendo, vou me utilizar de um esquema que tem ajudado a explicar o contexto.
Fonte: Gestão Origami
A leitura do esquema é de cima para baixo e, conforme desce,  seguindo às setas.
Vamos começar pelo desejo de “inserir a sustentabilidade no negócio”. Usualmente tendemos a nos pautar pelas referências (GRI, ISE, AA100, dentre outras), o que nos leva a uma agenda super extensa de temas e complexidades. Nem todos eles estão respaldados pela lógica econômico-financeira e, quando isso acontece, só nos restam os valores, as crenças, para fazer a agenda andar.
Vamos então separar estes temas em 3 grandes blocos, organizados por sua natureza e por sua lógica de como tratá-los. Aqui na Origami temos separado da seguinte forma:
1)   INDUÇÕES SOCIAIS – Temas que são derivados de mudanças no comportamento social. Sabemos que temas assim tendem a começar por mobilizações aqui e acolá na sociedade, ganham espaço quando entram nas articulações da sociedade civil organizada mais representativas, ganham mais espaço ainda quando se inserem na articulação política e, se tudo correr bem, geram marcos legais. Daí para frente é uma questão de cumprimento para estar dentro dos parâmetros legais. Alguns exemplos: o Código Florestal está quase atingindo (para bem ou para o mal) o estágio de marco legal, assim como a Lei Nacional de Resíduos Sólidos. Para estes temas e os que decorrem deles não temos muito mais o que discutir no campo do cumprimento. Não cumprir é, desta forma, um risco e este risco pode ser traduzido em algum momento na dimensão financeira e reputacional. Já outros temas, como por exemplo e legalização do aborto, a oficialização do cargo de lobista, até mesmo as sacolinhas plásticas do super mercado, estão em estágios anteriores. Desta forma, tudo o que está em estágios anteriores configura-se como um risco futuro e, a depender das mudanças necessárias para se adaptar à nova realidade, as empresas devem começar a se mobilizar com antecedência. Para aprofundar esta discussão sugiro a leitura de meu post“Olhando adiante: o ano é 2050″.
2)   INDUÇÕES ECONÔMICAS – Temas que já hoje ou no futuro próximo geram ganhos ou perdas de mercado, eficiência /produtividade e acesso a capital (custo pago pelas empresas para acessar recursos financeiros externos aos seus). Temos vários casos nesta situação e, não estranhamente, é neste ponto onde a agenda da sustentabilidade mais avançou. Ou seja, repare que ela avançou muito neste ponto pela correlação direta com o mundo econômico-financeiro das empresas. Exemplos: produção mais limpa, geração zero de resíduos, reprocessamento de resíduos de uma indústria como insumo de outras, produtos voltados a públicos específicos (como mulheres, negros, homens, homossexuais, dentre outros) e por aí afora. Neste caso, a lógica predominante é o RETORNO e não o RISCO como no caso anterior.
3)   AUTO INDUÇÃO – O que sobrou. Ou seja, todo e qualquer tema que hoje não consigamos explicar pelas duas lógicas acima (RISCO e RETORNO), só nos resta o argumento da CRENÇA, ou seja, dos valores que acreditamos ou queiramos acreditar como organização. Daí o nome “auto-indução” pois, ao declarar determinados valores a serem perseguidos e introjetados no modelo de operar da empresa, a mudança não ocorre de um momento para o outro, sendo portanto um processo de indução a novos processos, comportamentos e atitudes. E por isso toma tempo, consome recursos, exige mudanças de paradigmas, etc.
Observe que um mesmo tema da sustentabilidade, por exemplo “diversidade”, pode ter características distintas em ambientes empresariais distintos. Para uma empresa de turismo, a homossexualidade já se mostrou um mercado muito atraente e, portanto, é uma oportunidade de RETORNO aos seus investimentos, independente de seus valores/crenças relacionados a este tema. Já para outra empresa onde seus produtos e serviços não sofrem variações em função deste aspecto, e ao mesmo tempo o fato de que a homossexualidade ainda não é regulada (marco legal) de forma ampla e profunda, só restam portanto os valores desta empresa para dizerem se este tema deverá avançar ou não na agenda estratégica de sustentabilidade. O contrário somente ocorrerá caso você consiga demonstrar, no contexto da empresa, que “diversidade” mantém relação comprovada com RETORNO ou RISCO.
Isto posto, sugiro que você, caso esteja no grupo dos que estão tentando convencer os outros através de argumentos “sustentabilizadores e sustentabilizantes”, repense sua estratégia como profissional. A menos que sua opção profissional seja exclusivamente trabalhar no campo das crenças. Mas aí, então, não reclame ou critique a empresa…. demora mesmo. E não entre em crise…
É isso ai
Aerton

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