segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Faça acontecer

Não basta saber como funciona uma bicicleta. É preciso andar nela. Parece óbvio, não? Então por que tantos executivos não se dão conta de que boas idéias, somente, não geram resultados?

De boas idéias as organizações estão cheias. A carência está no fazer acontecer. Como é a gestão em sua organização? Ela trabalha só com diagnósticos e planos ou vai até o fim - até a implementação e a geração de resultados? Esta parece ser uma questão-chave hoje em dia, seja no mundo dos negócios ou na administração pública (veja entrevista com Peter Senge na pág. 82).

Quantos projetos são aprovados, iniciados e interrompidos tanto em empresas como em municípios e estados? Quanto em recursos materiais e humanos se desperdiça dessa forma em nosso país?

Quantas idéias só ficam nas conversas de corredor e nem sequer são apresentadas à organização por causa de algum tipo de medo?

Quantas idéias são abafadas no nascedouro por chefes conservadores, colegas céticos, pessoas pessimistas e uma cultura organizacional exclusivamente voltada a preservar o status quo?

Quantas idéias vão perdendo força pela demora do processo de análise, avaliação, aprovação? Em quantos desses processos os interessados vão perdendo motivação? Em quantos a organização perde oportunidades por escorregar no timing?

Quantos bons projetos se perdem no meio de um sem-número de outros, deixando de receber a atenção necessária para deslanchar e ser concluídos? Até que ponto a poluição de projetos está gerando a síndrome do nada terminar?

Quantas idéias de excepcional potencial geram resultados medíocres por negligência no processo de implementação? Quantos projetos cinco estrelas são desperdiçados na mão de técnicos e executivos sem a qualificação apropriada?

Por que é tão comum a ocorrência de problemas na transição entre idéia e ação em nossas organizações e na sociedade?

Uma explicação poderia estar em aspectos culturais que não são devidamente trabalhados pelos sistemas de gestão vigentes:


Cultura de críticas e diagnósticos

Todos na organização sabem onde estão os problemas... dos outros. Muitos estudos e diagnósticos. Algumas idéias para solução. Pouquíssima ação visando o fazer acontecer. Baixo envolvimento e comprometimento.


Cultura de palpites e idéias irresponsáveis

Muita gente palpitando sobre a área dos outros ou sobre "o que resolveria todos os problemas da organização". Muitas idéias jogadas no ar de forma irresponsável (não são da seara dos autores e eles não têm nenhuma intenção de se envolver diretamente com o problema).


Cultura de queixas e lamentações

Pessoas na organização excessivamente sensíveis às barreiras que impedem a implementação de novas idéias. Cultura que torna as pessoas insensíveis às oportunidades e as faz desistir com facilidade.


Cultura do ceticismo e negativismo

Pessoas que não acreditam na possibilidade de criar uma organização melhor. Pessoas que estão permanentemente em busca de evidências que mostrem o pior. Pessoas que continuamente jogam os idealistas da organização para baixo, muitas vezes abortando seus projetos.


Cultura das receitas e modismos

É a busca das soluções rápidas e aplicação de "fórmulas que dão certo". É a cultura do simplista e fácil, que faz todo projeto mais "sob medida" ser abandonado por ficar complexo demais (mais pela dificuldade de lidar com a complexidade do que por uma busca legítima de simplicidade).


Cultura de rejeição do inédito

É a aceitação tão-somente de práticas gerenciais ortodoxas. Todo o resto é rejeitado. Resultado: não se consegue lidar com desafios inéditos (que exigem soluções também inéditas).

À medida que estivermos conscientes de que boas idéias não bastam, o que é possível fazer na direção de uma gestão que valorize sua implementação com excelência, velocidade e excepcional eficácia? Como seria uma gestão capaz de gerar uma cultura voltada a resultados e a um efetivo fazer acontecer?


1. Atenção dos líderes à questão da implementação

Muitos líderes parecem operar sob a premissa de que "uma vez tomada pela cúpula, a decisão está automaticamente implantada". Uma gestão que faz acontecer exige líderes que dêem o devido valor à implementação e invistam a devida energia (inclusive deles próprios) para assegurar que o resultado efetivamente apareça.


2. Fazer acontecer como ponto de avaliação

Implementação com excelência, velocidade do fazer acontecer, timing apropriado, ir até o fim, terminar o que se começa, rapidez da idéia à ação passam a ser, nessa gestão, pontos importantes na avaliação de todos (do office-boy ao presidente) na organização. É preciso ainda uma avaliação que seja levada a sério com efetiva participação dos líderes (estes também sendo avaliados).


3. Indicadores para eficácia em fazer acontecer

Nesta gestão, é chave a existência de um scorecard apropriado, sob medida para a questão do fazer acontecer. Se há indicadores claros de resultado, há atenção dos líderes e de todos na empresa: Como estamos em relação há um ano? Melhoramos em nossa capacidade de fazer projetos chegarem ao fim? De geração de novas idéias de impacto que são implementadas com excelência? Estamos melhorando em velocidade?


4. Adequação entre projetos e recursos

Na gestão que faz acontecer há um contínuo monitoramento da quantidade de projetos em relação aos recursos disponíveis, principalmente aqueles na forma de tempo e energia das pessoas. Importante também é a gestão do que deve ser descontinuado, ou seja, o que a organização deve parar de fazer para liberar energia para as inovações necessárias. A questão "coisas que fazemos hoje, mas deveríamos parar de fazer" deve ser trabalhada na organização como um todo pelo menos uma vez por ano. Parece ser o melhor antídoto para o problema da poluição de coisas a fazer.


5. Formação de pessoas voltadas a um efetivo fazer acontecer

Nesta gestão, todos os programas educacionais (da base à cúpula) são voltados ao desenvolvimento de competências necessárias a um efetivo fazer acontecer. A premissa aqui é de que ter conhecimentos não basta. É preciso investir na competência de usar bem o que se sabe. Não basta saber como funciona uma bicicleta. É preciso saber andar nela. E muito bem. E conseguir chegar ao objetivo a tempo.


6. Composição adequada de implementadores

Na gestão do fazer acontecer, a questão da qualificação dos profissionais que fazem acontecer recebe especial atenção. Projetos operacionais são diferentes dos estratégicos. Daí a importância de uma equipe equilibrada de implementadores: dos mais juniores (para os projetos mais táticos) aos pesos pesados (para os grandes projetos). Normalmente, nota-se um descasamento nessa composição: falta de pesos pesados e excesso de pesos leves para uma crescente demanda de desafios estratégicos.


7. Trabalho sistemático das barreiras

Na gestão do fazer acontecer é parte importante das responsabilidades das lideranças a criação de um clima apropriado para inovações. Isso significa estímulos contínuos e a sistemática e cuidadosa eliminação de barreiras a uma efetiva implementação de novas idéias. Uma gestão refinada do fazer acontecer leva em conta não só as barreiras externas mas também as barreiras que estão dentro das pessoas (veja quadro abaixo).

Gestão do fazer acontecer significa, em última instância, assegurar uma cultura em que todos os colaboradores da organização estejam genuinamente interessados em ir muito além do plano das idéias. E motivados a fazer diferença. Sair da cultura do diagnóstico, dos palpites, dos projetos que não chegam ao fim, da demora e da implementação medíocre não é fácil. Mas pode começar de forma simples - por exemplo, introduzindo o tema nas conversações que acontecem na organização, da diretoria à base: Como fazer com que todas as boas idéias aqui geradas recebam energia suficiente para não parar e poder produzir efetivos resultados? Que tal dar início a essa rede de conversações ainda hoje?

Que tal fazer acontecer?


* Oscar Motomura é diretor-geral da Amana-Key


Você tem idéias sobre como fazer acontecer a cultura do fazer acontecer na empresa? Boas histórias sobre o tema? Envie-as a fazendo.acontecer@amana-key.com.br.
 
http://exame.abril.com.br/revista-exame/edicoes/0690/noticias/faca-acontecer-m0053538
 

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