terça-feira, 3 de julho de 2012

Professor da FGV cria métrica para medir resiliência em profissionais


Poucas semanas após o tsunami que abalou o Japão no início de 2011, o mundo viu aquele país reconstruir estradas e edificações com determinação e prontidão. Nos Estados Unidos, as lições com o Katrina foram essenciais para o enfrentamento do furacão Irene no final de agosto. Nesse episódio, Nova Iorque deu sinais do aprendizado obtido com o 11 de setembro, demonstrando melhor preparo para fazer frente a adversidades. Por trás dessa capacidade de superação está o conceito de resiliência, tema que vem ganhando importância na atualidade, tanto que fez parte do discurso do presidente Barack Obama por ocasião dos 10 anos dos atentados às Torres Gêmeas.
“A resiliência é a principal competência desta primeira metade do século 21”, afirma Paulo Yazigi Sabbag, professor da EAESP – Fundação Getulio Vargas e idealizador da primeira escala nacional para avaliar o nível de resiliência de profissionais adultos. Na evolução de suas pesquisas sobre empreendedorismo, o especialista colocou foco no tema resiliência e, a partir de um estudo de campo, criou a métrica ERS, que vem se juntar a outras quatro existentes no mundo. Validada para o contexto brasileiro, a escala relaciona nove fatores inerentes à resiliência – autoeficácia, solução de problemas, temperança, empatia, proatividade, competência social, tenacidade, otimismo e flexibilidade mental.
O estudo envolveu 3.707 alunos graduados de curso aberto a distância de especialização em Administração, da FGV, profissionais de 61 cidades, de grandes centros urbanos a cidades pequenas e distantes.
Os resultados obtidos a partir de 1.512 respostas válidas indicaram uma porcentagem de 16% de pessoas com baixa resiliência, segundo a escala ERS. Enquadraram-se no patamar de elevada resiliência 40% dos participantes, enquanto 44% foram identificados como tendo resiliência moderada. Nessa modalidade, a questão de gênero apresentou impacto relevante, a partir da existência de dois estilos de resiliência moderada, a masculina e a feminina. O tipo feminino apresenta melhor pontuação em quesitos como empatia e articulação de apoio social, perdendo na questão temperança. Já o tipo masculino, que pontua menos no item empatia, consegue regular melhor as emoções e se sobressai em tenacidade e solução de problemas.

Dilema ético
Uma escala capaz de avaliar o grau de resiliência de adultos profissionais traz novas perspectivas para as empresas, especialmente as que atuam em mercados dinâmicos e intensivos em inovação. Há, no entanto, um dilema ético relativo ao uso de escalas como a ERS: o emprego indevido da separação dos indivíduos de acordo com um modo distinto de enfrentar graves adversidades. “Seria condenável e ineficaz a aplicação de um instrumento como esse para efeito de recrutamento e seleção, até porque a somatória de indivíduos resilientes não resulta em uma empresa resiliente”, ensina Sabbag.
Por outro lado, ele enfatiza que a resiliência é uma competência passível de ser aprendida e que, nessa medida, as escalas são fundamentais para auxiliar o desenvolvimento das pessoas. “Gestores, em geral, precisam desenvolver a resiliência, pois vivem premidos pela exigência de desempenho e pelo cumprimento de metas, em um ambiente de maior complexidade e que muda rápida e constantemente. Estruturas matriciais, atuação por projetos, riscos inerentes à inovação compõem um cenário onde a forma de enfrentamento das adversidades faz toda a diferença.”
No que se refere à resiliência das organizações, Sabbag acredita que essa competência está ancorada nos valores e nos propósitos corporativos. “Há empresas que enfrentam melhor as situações de crise, demonstrando resistência durante os processos e crescendo com eles. Para outras, o efeito é devastador, podendo mesmo resultar no desaparecimento da organização”.

Teoria na prática
A resiliência desempenha papel crucial em tempos de rápidas e profundas mudanças. Para Sabbag, as empresas que se empenharem em trabalhar essa competência de forma estruturada tendem a se destacar, pois se tornam mais aptas a enfrentar um panorama de imprevisibilidade e incertezas, onde a demanda por inovação é crescente. “Estamos vivendo a transição da sociedade industrial para a era do conhecimento. Não se trata de algo episódico, mas de uma alteração estrutural, com muitos desdobramentos e um suceder de crises a serem administradas”.
Nesse contexto, promover o crescimento do nível de resiliência pode ser crucial para as organizações. Isso porque gestores resilientes controlam melhor as emoções, o que traz objetividade para lidar com situações adversas. Além disso, desenvolvem a empatia e, atentos aos sentimentos das pessoas, conseguem amparar e acolher aqueles que necessitam de apoio. “Esses líderes aprendem com as crises, encarando-as como fonte de crescimento. Eles servem de modelo e reforçam os valores corporativos, contribuindo de forma definitiva para ampliar também o nível de resiliência da própria companhia”, conclui.

RESILIÊNCIA – OS NOVE FATORES
Autoeficácia
Crença na própria capacidade de organizar e executar ações requeridas para produzir resultados desejados Associada à autoconfiança, transforma-se em “combustível” para a proatividade e a solução de problemas.
Solução  de
problemas
Característica dos agentes de mudança, indivíduos equipados para diagnosticar problemas, planejar soluções e agir, sem perder o controle das emoções. Aliada a proatividade, tenacidade e flexibilidade social, mobiliza para a ação, contrapondo-se à postura de idealizar positivamente o futuro.
Temperança
Está associada ao controle da impulsividade. Significa maior capacidade de regular emoções com flexibilidade, mantendo a serenidade (ou a “frieza”) em situações difíceis ou de pressão.
Empatia
Habilidade básica e promotora tanto da competência social quanto da solução de problemas. Significa compreender o outro a partir do quadro de referência dele.
Proatividade
Está associada a desafios, a conviver com incertezas e ambiguidades. Refere-se à propensão a agir e à busca de soluções novas e criativas. Reativos tendem a esperar pelos impactos de adversidades; enquanto os proativos tomam iniciativas.
Competência social
Apoio externo diminui sintomas de estresse e reduz a vulnerabilidade de indivíduos submetidos a condições adversas. A ERS considera não só a abertura a receber apoio de outros, mas a busca proativa e flexível de apoios (flexibilidade social).
Tenacidade
Persistência e/ou capacidade de aguentar situações incômodas ou adversas. 
Otimismo
Na ERS, o otimismo se alia à competência social e à proatividade, tendo por base a autoeficácia.
Flexibilidade mental
Está relacionada a uma maior tolerância à ambiguidade e a uma maior criatividade. O pessimismo faz com que o indivíduo de baixa resiliência insista teimosamente em cursos de ação que não se mostram efetivos. Já o resiliente, em oposição, é flexível: pensa em opções, age, e se a ação não é efetiva, escolhe outra opção e persiste.

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