quinta-feira, 6 de setembro de 2012

A linha tênue entre o engajamento e o comprometimento de talentos



É muito satisfatório e até mesmo cômodo para uma liderança ver que um talento da equipe destaca-se por realizar suas atividades nos prazos estabelecidos e mostrar sinais claros de comprometimento. Contudo, é preciso constatar se aquele profissional também está engajado com a empresa. Isso porque nem todo colaborador que cumpre com suas tarefas está obrigatoriamente motivado com o tipo de gestão que vivencia. Segundo Eduardo Carmello, diretor da Entheusiasmos Consultoria em Talentos Humanos, consultor organizacional e especialista em Gestão Estratégica de Pessoas, existe uma intersecção entre engajamento e comprometimento. "Quando estou comprometido, significa que estou consciente do meu compromisso funcional, que cumpro com meus papéis e minhas responsabilidades. Quando estou engajado, estou envolvido emocionalmente, há uma disposição e uma conexão emocional que faz meu olho brilhar. O engajamento também seria o compromisso funcional mais o envolvimento emocional", explica. Em entrevista concedida ao RH.com.br, o consultor pontua os principais fatores que contribuem para o engajamento de um profissional, bem como aqueles que interferem negativamente para que o profissional não tenha uma entrega por completo. Sem dúvida alguma, essa é uma entrevista que fará você, leitor, refletir não apenas no que se refere à entrega do seu time, mas também à sua própria atuação profissional. Vale lembrar que Eduardo Carmello é um dos palestrantes da Jornada Virtual de Liderança - evento promovido pelo RH.com.br, no período de 13 a 28 de setembro de 2012. Na ocasião, Carmello conduzirá a palestra "Gestão da Singularidade - Estratégias diferenciadas para talentos diferenciados". Boa leitura!

RH.com.br - O mercado corporativo vivencia um acelerado processo de mudanças e isso faz com que as empresas necessitem de profissionais que deem o máximo de entrega. Engajamento é sinônimo de comprometimento ou são conceitos distintos?
Eduardo Carmello - Há uma intersecção entre eles. Quando estou comprometido, significa que estou consciente do meu compromisso funcional, que cumpro com meus papéis e minhas responsabilidades. Eu fiz um acordo com algo ou alguém e vou trabalhar até que a promessa do produto, do serviço ou da experiência se realize. Quando estou engajado, estou envolvido emocionalmente, há uma disposição e uma conexão emocional que faz meu olho brilhar. O engajamento também seria o compromisso funcional mais o envolvimento emocional. Por exemplo: eu posso estar comprometido sem estar engajado quando eu vejo que meu gestor não me orienta ou apoia e mesmo assim não deixo de fazer minhas tarefas como foi acordado. Eu vou fazer o que precisa ser feito, mas quando me perguntam como percebo meu gestor ou empresa, eu vou dizer: "É satisfatório, nota seis ou sete".
Agora, quando estou engajando, eu cumpro com minhas tarefas e estou disposto a fazer mais, pensar mais, ajudar mais porque eu acredito nos valores do meu gestor e da empresa, porque tenho apoio, confirmação, porque eu vejo que todos estão envolvidos em fazer o melhor. Quando me perguntam como percebo meu gestor ou empresa, vou dizer: "É Genial. É fantástica, nota nove ou dez". Ter funcionários comprometidos e engajados diante da mudança é fundamental para o processo de melhoria de valor e da performance nas empresas.

RH - Tem sido muito complicado para as organizações formarem equipes com profissionais engajados?
Eduardo Carmello - Há duas grandes questões. Primeiro existe a dificuldade em gerenciar as mudanças complexas que as organizações precisam fazer: muita mudança sem bons planejamentos; muita confusão e pouca experiência de sucesso; muitas discussões sobre mudança; muitas solicitações para que os talentos "acreditem" na mudança e pouco planejamento e estrutura formal de mudança. Isso faz com que os profissionais entrem num ciclo vicioso, que é ter que passar por uma grande mudança, se esforçar muito para prepará-la, fazer uma implantação e cinco ou seis meses depois vir alguém e mudar tudo de novo. A não realização de um projeto completo, muitas vezes por falta de planejamento estratégico ou por falta de acompanhamento eficaz dos projetos gera inseguranças, desconfianças e muitos questionamentos.
Segunda questão: a baixa eficácia nos sistemas de apoio - estratégia, cultura, liderança, Recursos Financeiros ou tecnológicos. Em geral, empresas e gestores querem ter pilotos de Fórmula 1, dando a eles um carro 1.0 e uma equipe de dois profissionais para trocar todos os pneus em oito segundos. Há muita cobrança, pouco apoio e escassos recursos para alcançar o status que todos dizem querer alcançar, que é a "alta performance".

RH - Quais os principais fatores que contribuem para o engajamento de um profissional?
Eduardo Carmello - Muitos gestores confundem motivação com engajamento. Querem dar um motivo para "aumentar o gás" dos membros da equipe e deixá-los felizes investindo em atividades motivacionais. Mas quando voltam para o trabalho, continuam com os mesmo problemas. O que os talentos e as equipes de alta performance nos revelam como fatores críticos de sucesso para aumentar seu engajamento são: primeiro - bons desafios, com estratégia bem clara sobre o impacto para a organização e para eles. Precisam saber o norte e a causa do desafio. Segundo: precisam ter capacidade de realização. Gostam e querem trabalhar com quem é competente e comprometido. Terceiro: precisam ter possibilidade de aprendizagem real e contextual, que os ajudem a se diferenciar. Quarto: esperam que o seu gestor seja alguém que cobre performance, que seja justo, meritocrático e que esteja próximo durante as turbulências e os principais desafios. Que seja um referencial e um exemplo de competência e representante dos valores da marca.

RH - E quais os pontos que mais dificultam o engajamento de um talento?
Eduardo Carmello - Analisando mais profundamente os indicadores de clima e engajamento, identificamos que os pontos mais frágeis e impactantes estão ligados à percepção de injustiça ou à incoerência de reconhecimento e de mérito dentro do ambiente do trabalho. Primeiro - O talento não vê coerência estratégia: a empresa divulga uma prática e faz outra. Promove quem não tem competência. Dá direitos a quem não pertence. Uma regra importante de conduta vale só para alguns, não para todos. Segundo - Muitas barreiras, pouca autonomia: o talento sabe o que fazer, mas grande parte do seu tempo e energia é gasto apagando incêndio, criando relatórios sem sentidos, participando de reuniões improdutivas e perdido em processos mal definidos. Terceiro - Valores não praticados no momento da verdade: ninguém aguenta mais comunicados e palestras sobre ética, transparência, respeito ao cliente, saúde e segurança e depois chegar ao ambiente de trabalho e ter que presenciar todos estes valores desrespeitados no dia a dia. Estamos criando ambientes onde os profissionais estão descrentes e cínicos em relação aos valores. E depois o RH gasta tempo e um dinheiro enorme, tentando minimizar estes sintomas que afligem as pesquisas de clima e engajamento. Quarto - Muita cobrança, pouco apoio, má distribuição dos papéis e tarefas: os bons talentos acabam sempre tendo como recompensa trabalhar mais. Essa não é a queixa, porque eles gostam de desafios. A queixa é trabalhar muito, porque o colega ao lado ou o chefe não está fazendo a sua parte no projeto e, no final, todos ganham o mesmo salário ou bônus. É verificar que há uma distribuição equivocada e injusta de tarefas, responsabilidades e méritos.

RH - Um talento engajado pode ser confundido com um workaholic?
Eduardo Carmello - Sim, e é possível que ele seja mesmo. Agora estão inventando um novo termo, que é oworklover, que é o profissional que ama o que faz. De qualquer forma, é alguém com muita disposição e energia para realizar e produzir valor. O talento engajado também pode ser visto como "puxa-saco" ou o cara que está dando a mais porque quer alguma coisa em troca. Em geral, é comentário típico dos não-engajados ou daquele que produzem abaixo do esperado.

RH - Podemos mensurar o engajamento por níveis?
Eduardo Carmello - Por uma razão de didática e para facilitar a compreensão, prefiro utilizar a nomenclatura utilizada pelo Instituto Gallup. Engajados: energia, empenho, sentimento de conexão com a empresa. Não engajados: comprometidos e fazem o esperado, mas com pouca ousadia e protagonização. Ativamente desengajados: atitudes passivas, negativas e, às vezes, destruidora de valor. O Instituto Gallup apresentou uma pesquisa no Brasil em 2006, com 1012 profissionais de 11 capitais brasileiras, demonstrando que temos 21% de profissionais engajados e 79% de profissionais não Engajados e ativamente desengajados.

RH - Qual o nível de proximidade entre engajamento e a alta performance?
Eduardo Carmello - No livro "Primeiro quebre todas as regras", de Buckingham e Coffman, os autores demonstraram que os funcionários mais engajados são mais produtivos, focados, praticam mais os valores, com capacidade de execução superior e menos propensos a deixar a empresa. Conseguiram demonstrar inclusive que geram mais receita para a empresa e uma experiência mais positiva e valorosa ao cliente.

RH - Quais as características de uma Gestão de Pessoas que consegue manter engajados talentos de alta performance?
Eduardo Carmello - Os principais congressos brasileiros de Gestão de Pessoas estão sempre produzindo informações relevantes sobre as práticas que aumentam a retenção de talentos. Algumas eu destacaria aqui.
Primeiro - Definir para os talentos de alta performance os objetivos, os processos e os prioridades envolvidos para a conquista dos desafios estratégicos. Pedir para acreditar na mudança e ser proativo é bom, mas dizer qual é a estratégica, porque estamos indo nessa direção e demonstrar como vamos chegar lá é fundamental.
Segundo - Análise profunda e precisa das questões de engajamento e performance, com tratativas para as causas e não só para os sintomas. Ter uma sala de jogos ou academia é bacana, mas resolver os principais processos emperrados ou capacitar os gestores que geram a ineficácia e o desânimo do talento é bem melhor.
Terceiro - Alta capacidade para subsidiar conhecimento e acompanhar processos de desenvolvimento: dar 20 horas de treinamento é requisito básico, mas produzir um ótimo plano de desenvolvimento, com feedback, avaliação e acompanhamento engaja muito mais.
Quarto - Reconhecer atitudes e comportamentos no processo, indicando conquistas e desafios: no mundo apressado e tenso de hoje, muitos talentos estão conseguindo fazer projetos extraordinários, quase impossíveis. Recebem como feedback informações parecida como: "Parabéns, não fez mais do que a obrigação, mas amanhã temos um desafio muito maior". Existem muitos profissionais excelentes, fazendo tarefas incríveis e não sendo reconhecidos por isso.

RH - Em sua opinião, o que um talento engajado espera da organização em que ele atua?
Eduardo Carmello - Estou convicto que um talento engajado espera espaço para atuar, oportunidade para criar e desenvolver, um sistema meritocrático e justo de performance, pois ele entende o que é criar valor e espera que a empresa também ofereça condições para que a produtividade, os valores e a inovação façam parte do cotidiano da empresa. Talentos engajados sabem que conhecimento, tempo e energia são o combustível fundamental para gerar valor num mercado de alta complexidade. Qualquer atividade que não tenha qualidade, que seja burocrática, excessivamente política, feudal, injusta ou sem meritocracia simplesmente atrapalha sua excelência operacional e sua capacidade de pensar, gerando desgastes que ele não pode se dar ao luxo de suportar.

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