quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Deixe de fazer o que não deseja

DEIXE DE FAZER O QUE NÃO DESEJA

Por:
Por: Reinaldo Polito
Se o seu colega de trabalho costuma entrar intempestivamente em sua sala nos momentos mais impróprios, quando, por exemplo, você está cuidando de assuntos importantes, e isso o incomoda. Se a sua namorada ou namorado tem o péssimo hábito de ficar o tempo todo grudado no celular durante o jantar, sem lhe dar atenção. E você se sente mal porque não sabe como dizer a eles que essas atitudes o aborrecem tanto, está na hora de aprender a ser mais assertivo. Desenvolver uma comunicação assertiva não significa estabelecer confronto com outras pessoas, mas sim falar o que precisa ser dito, no momento certo e da forma adequada. Sendo assertivo você construirá relacionamentos mais sólidos, projetará uma personalidade mais consistente e conquistará mais atenção e admiração das pessoas.
Recentemente nosso curso de Expressão Verbal foi contratado para treinar executivos de uma multinacional no México e na Argentina. Com tanta gente boa ensinando a falar em público nesses países, me pareceu curioso sermos contratados. Mas, como a unidade deles aqui no Brasil é muito importante e o meu livro Cómo hablar bien em publico foi publicado com sucesso pela editora EDAF da Espanha, que tem forte representatividade em quase todos os países de língua espanhola, deu para compreender em parte essa contratação, mesmo sendo o treinamento realizado em inglês. O que até hoje não consegui entender muito bem foi uma proposta de trabalho curiosa e inusitada que eu e a professora Marlene Theodoro, responsável pelos cursos de técnicas de apresentação em inglês da nossa escola, recebemos de uma coach inglesa. Ela solicitou que fizéssemos um trabalho especial com um de seus clientes americanos. Percebeu agora por que achei estranha a proposta de trabalho? Uma coach inglesa contratando um profissional de um país localizado bem abaixo da linha do Equador para ensinar um americano! Ela explicou, eu fingi que entendi, mas até hoje continuo com essa interrogação.
A situação do executivo americano era preocupante. Nas pesquisas que realizara, a coach descobriu que seu cliente, responsável por várias empresas de uma grande corporação, corria o risco de perder o emprego por causa da atitude e da comunicação. O grande chefe achava que ele era muito condescendente com sua equipe de trabalho. Mesmo diante de deslizes profissionais gritantes não conseguia repreender os subordinados durante as reuniões. Ele reconheceu que essa era uma característica sua, mas que não se sentia bem chamando a atenção dos colaboradores na frente do grupo. Entretanto, para os padrões americanos não havia justificativa para esse comportamento excessivamente conciliador. Queriam que ele mantivesse contatos mais duros, ásperos, próprios da posição que ocupava. Depois de uma análise mais profunda concluímos que sua comunicação com os diretores que participavam da sua equipe precisaria passar por algumas alterações. Não poderia continuar com a passividade que o estava prejudicando aos olhos do presidente, mas também não deveria ser agressivo. Ele teria que desenvolver uma comunicação assertiva. Durante os dois dias que passamos juntos ele aprendeu como se relacionar com os subordinados de maneira clara, direta, objetiva, sem, contudo, desconsiderar os sentimentos e a posição dessas pessoas.
Essa é uma qualidade da comunicação assertiva que precisa sempre ser considerada - levar em conta os sentimentos e a posição do interlocutor.
Nada de rodar a baiana
Ser assertivo não significa sair por aí distribuindo bronca a torto e a direito. Ao contrário, quando as pessoas têm um comportamento passivo diante das situações que as incomodam, algumas podem se sentir tão pressionadas que às vezes não conseguem medir suas reações e se tornam agressivas. Mesmo sem perceber, por não ser assertivo, você pode estar sendo agressivo diante de uma atitude que o contrarie. No caso da namorada que fica o tempo todo falando ao telefone durante o jantar, embora você não diga nada com receio de magoá-la, talvez sua fisionomia denuncie um comportamento emburrado e até hostil. Se ela não souber que a atitude de falar ao telefone naquela circunstância o deixa chateado, poderá imaginar que o motivo de sua contrariedade seja outro.
Por isso, não parta para o outro extremo, repreendendo as pessoas porque não agem de acordo com sua vontade. Isso é grosseria, não assertividade. A comunicação assertiva tem por objetivo esclarecer situações obscuras, enevoadas, que por não serem discutidas de forma correta e permanecerem desconhecidas por pelo menos uma das partes podem produzir desconfortos e mal-entendidos.
Veja o caso de Carlos Roberto. Ele trabalhava como supervisor em uma loja de eletrodomésticos e vivia contrariado com as atitudes do gerente a quem estava subordinado. Todas as vezes que estavam em reunião, o gerente acabava se lembrando de algum fato passado que ridicularizava o subordinado. Um dia comentava sobre uma contratação mal-feita de um encarregado, que era tão incompetente que precisou ser dispensado dois dias depois de ter iniciado na empresa. Em outra reunião se lembrava de um plano de metas que não chegou a ser atingido por cauda de um produto que Carlos Roberto comprara e que não girou no estoque com a velocidade que precisava. Assim, entrava reunião, saia reunião e na frente de todos o gerente sempre tinha uma história do supervisor para contar e deixá-lo sem jeito diante dos colegas e dos outros empregados. E quando não havia mais casos novos, não tinha o mínimo escrúpulo de repetir histórias já comentadas. Um belo dia Carlos Roberto, não agüentando mais tanta humilhação, rebelou-se respondendo encolerizado ao seu chefe. Por muito pouco não foi demitido. Pensando melhor na discussão que tivera, chegou à conclusão que não agira de maneira correta e que precisaria mudar a forma de se comportar. Embora não soubesse, faltava a ele habilidade para se comunicar com assertividade.
A conversa certa no lugar certo
No caso do Carlos Roberto, a atitude descontrolada ficou muito longe de um comportamento assertivo. Em primeiro lugar, o local escolhido para revelar seu descontentamento não foi o mais indicado. Ele deveria falar com o gerente separadamente, sem a presença de alguém. Depois, a maneira agressiva de dizer o que o estava incomodando. Uma boa estratégia seria a de relatar, sem tom de crítica, como o comportamento do gerente se repetia reunião após reunião, como ele se sentia envergonhado diante daquela situação, pediria para que mudasse de atitude, mostrando como essa mudança o deixaria mais à vontade e, provavelmente, em condições de ser mais participativo naqueles encontros. Observe que estou sugerindo no final o uso da persuasão, já que ele ser mais participativo nas reuniões se trata de uma atitude que interessa também ao gerente. Fica claro, portanto, que comunicação assertiva não deve prescindir das técnicas de persuasão. Durante a conversa, Carlos Roberto deveria falar de maneira firme, sem hesitações.
Nessas circunstâncias é muito importante, embora seja difícil, não demonstrar nervosismo ou descontrole emocional. Se um dia você passar por situação semelhante, fale sem desviar os olhos do interlocutor, evite esfregar nervosamente as mãos, segurar a voz na garganta, ou apresentar outras demonstrações de desconforto. Eu sei que nem sempre é tão simples agir assim, mas esse é o melhor caminho a ser seguido. Você será ouvido com mais respeito se falar olhando para o interlocutor, usar um bom volume de voz, como se diz vulgarmente, “falar para fora”. Para agir assim você precisará de prática e, como já alertei, de determinação. Pratique inicialmente em situações mais simples, com pessoas mais próximas, onde as conseqüências não sejam tão graves, e à medida que for se sentindo mais experiente e descontraído atire-se em empreitadas mais complexas.
Trabalhando com os sentimentos
Talvez o aspecto mais difícil de ser trabalhado na comunicação assertiva é o sentimento. O seu e o do seu interlocutor. Por mais gentil e claro que você seja, ao dizer a uma pessoa que o procedimento dela o desagrada, poderá provocar uma atitude defensiva e, em alguns casos, até agressiva. Por isso, prepare-se para enfrentar essas reações como sendo normais e fazendo parte do processo. Tenha em mente também que nem todas as pessoas aceitarão uma conversa mais franca. O importante é saber que a situação deve ser resolvida, ou por ser errada, ou por ser injusta, ou porque o desagrada e que você agirá da forma mais eficiente que puder para não desagradar ou não tornar a outra pessoa infeliz, mas se isso vier a ocorrer, ela deverá se conscientizar de que não estava agindo de maneira adequada e encontrar dentro de si mesma o equilíbrio que precisa. Portanto, não se esqueça de que a felicidade dos outros não depende de você, mas deles mesmos.
Dentro dessa tese, tome cuidado para não imaginar desnecessariamente e de forma exagerada que a outra pessoa irá se sentir muito mal ao ouvir suas ponderações. Embora isso possa ocorrer, nem sempre acontece e quando surge a reação negativa, na maioria das vezes a intensidade é menor do que se espera.
Saiba que se acomodar em conversas superficiais, evitando esclarecer situações que o incomodam é só uma forma de adiar um confronto que no futuro terá muitas chances de ocorrer. Sem contar que embora possa existir um desconforto momentâneo, os resultados da comunicação assertiva projetarão sua imagem e sua personalidade de maneira muito mais positiva.
Analise sua munição
O que você vai fazer se a pessoa não mudar de atitude? No exemplo do Carlos Roberto, por ser um excelente funcionário e a empresa precisar muito da sua colaboração, desde que a situação fosse mesmo insuportável, ele poderia dizer que se o gerente não mudasse de comportamento pediria para que o transferissem de setor ou até que se demitiria. Mas, para agir assim tinha que estar convencido de que talvez precisasse mesmo tomar uma dessas atitudes, pedir a transferência ou se demitir. Portanto, ao concluir a conversa, nunca ameace com promessas que não possa cumprir, pois se prometer e não agir perderá a credibilidade. Nem todas as circunstâncias exigem que a conversa termine com algum tipo de decisão semelhante a essa. Na verdade esses episódios constituem a minoria das situações. No caso do Carlos Roberto, por exemplo, ele poderia esclarecer o fato com o gerente e pedir que mudasse de comportamento. E só. Ao se conscientizar de que o seu subordinado se sentia mal com seu procedimento, muito provavelmente atenderia sua solicitação.
É importante também que você não se comporte como se estivesse sendo perseguido. Esclareça o que tiver que ser esclarecido, peça o que tiver que pedir, mas nada de choradeira. Conversa assertiva não inclui essas atitudes que acabam mais por prejudicar do que promover a imagem da pessoa.
Observe os aspectos culturais
Nesta época globalizada em vivemos tome muito cuidado com as diferenças culturais. Cada povo tem uma maneira própria de se comunicar. Se você tiver de conviver com pessoas de outros países aqui ou na região deles, saiba que aquilo que pode ser ofensivo para alguns é perfeitamente normal para outros.
Há pouco tempo contei uma história que ilustra bem essas diferenças culturais. Vou transcrevê-la exatamente como a relatei no texto anterior:
Tive um aluno alemão que, depois de viver muitos anos no Brasil, não se conformava mais com algumas atitudes de seus compatriotas. Disse que certa vez receberam a visita de um diretor da empresa que viera da matriz sediada na Alemanha. Contou que depois de a sua equipe ciceronear o visitante alemão por alguns dias, pouco antes de sua partida resolveram presenteá-lo com um livro.
Ficaram sem entender quando o diretor, com toda a frieza, recusou o presente. Ao levá-lo até o aeroporto, meu aluno perguntou a ele por que não havia aceitado o livro. Ele simplesmente respondeu que agira assim porque não lhe teria utilidade e não faria nada com ele. Meu aluno, já suficientemente abrasileirado, desabafou indignado: ora Fritz (entenda Helmut se desejar), isso foi uma descortesia. Deveria ter aceitado o presente de qualquer maneira; depois, quando estivesse sozinho, poderia até jogar fora, mas não magoaria as pessoas que queriam apenas agradá-lo.
Lógico que para o Fritz (ou você preferiu Helmut?) esse teatro não fazia o menor sentido, pois na sua cultura a consideração com os sentimentos é vista de forma totalmente distinta. Mas, nessa situação, se conhecesse um pouco mais sobre nossa cultura, saberia que se agisse de maneira diferente deixaria uma impressão muito mais positiva. Da mesma maneira que se os brasileiros soubessem que a forma de agir do alemão não tinha o objetivo de desrespeitar ninguém talvez aceitassem tudo com mais naturalidade. Embora, depois de refletir bastante sobre o assunto, eu tenha concluído que esse comportamento deva ser descortesia até na terra dele. Pelo sim, pelo não, vale como exemplo.
Se você já foi para a Itália deve ter notado que, de maneira geral, os italianos costumam conversar em voz alta e gesticulando bastante. Se alguém nos tratasse dessa maneira aqui no nosso país, poderíamos nos sentir ofendidos, enquanto que para eles é bastante natural.
Em caso de dúvida, enquanto não conhecer de forma conveniente as diferenças culturais, redobre o cuidado com a comunicação assertiva quando tratar com estrangeiros.
O preço de ser assertivo
Tudo na vida tem seu preço. Ser famoso, por exemplo, tem suas vantagens, mas é comum ouvir artistas que se tornaram populares reclamarem da falta de liberdade. Dizem que não podem sair às ruas sem serem abordados pelas pessoas que querem autógrafos ou fazer perguntas pessoais. Falando em liberdade, Sartre diz que a liberdade também é uma questão de escolha. É sempre assim, para se conquistar a tranqüilidade de viver numa cidade pacata do interior, somos obrigados a deixar as oportunidades da cidade grande. Para aproveitarmos tudo o que uma metrópole nos oferece, abdicamos da tranqüilidade das pequenas cidades. Com a comunicação assertiva não é diferente. Para dizer a alguém o que precisa ser dito com o fim de esclarecer mal-entendidos, marcar sua posição, reorientar rumos, tomar partido e até afastar da vida algum desconforto ou incômodo, será preciso conviver com algumas pessoas magoadas e até enfurecidas. Lógico que com jeito, traquejo e experiência essas inconveniências vão diminuindo, mas nunca desaparecerão totalmente. Cabe a você decidir se vale ou não a pena ser mais respeitado e viver uma vida plena e enfrentar alguns pequenos dissabores, ou continuar incomodado e até infeliz só para que as outras pessoas que o estão desconsiderando não sejam perturbadas. Sei também que tentei induzi-lo com esse comentário, mas é que acredito tanto em relacionamentos mais abertos e sinceros e gostaria muito que você também experimentasse. Depois, não precisa ser assim a ferro e fogo. Com sua sensibilidade, inteligência, bom senso e capacidade de discernimento, saberá julgar quando é o momento de agir e quando deverá se resguardar. Espero que use a comunicação assertiva para que seja cada vez mais feliz e para que possa também conviver com pessoas mais felizes. 
http://www.vencer.com.br/materiaCompleta.php?id=740

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