quarta-feira, 21 de julho de 2010

Introdução à TOC

Introdução à TOC

Artigo publicado na revista da Politec, em julho/2005
Lúcia é gerente de projetos em uma prestigiada fábrica de software brasileira. Muito dedicada e eficiente, constantemente é elogiada e premiada por sua atuação e exemplo. Todavia, apesar de seus esforços para concluir seus projetos com sucesso, algo a mantém acordada até tarde da noite.
“Eu sei que podemos melhorar... A equipe é ótima... Utilizamos as melhores ferramentas... Nosso processo é modelo para toda a empresa... Mas alguma coisa está faltando...”
E para se livrar desse pesadelo que a persegue noite após noite, ela tenta se distrair com a TV, ou lendo um livro, até que o cansaço a faça dormir.
Certa manhã, um colega de trabalho deixou em sua mesa um exemplar do livro “A Meta”, com um bilhetinho:
"Lúcia, um dos professores da pós-graduação recomendou esse livro e, após devorá-lo em dois dias, achei que seria muito útil para você. Quando terminar de lê-lo, me procure. Abraços, Lama.”
Por diversas vezes Lúcia viu este livro nas estantes das lojas, mas nunca lhe despertou a atenção. Afinal, estava mais interessada nos livros sobre gerência de projetos, administração e liderança de pessoas, gerenciamento de custos e assuntos afins. Mas um livro que falava sobre processos de fábrica? E ainda mais com um jeitão de novela? Não podia ser coisa séria...
De qualquer forma, ela o levou para casa e começou a lê-lo naquela mesma noite. Qual não foi sua surpresa ao olhar para o relógio e perceber que já eram quatro horas da manhã, e ela não conseguia parar de ler! Já havia passado um pouco mais da metade do livro e lamentou ter que deixá-lo na cabeceira da cama para dormir um pouco.
Naquela mesma manhã, Lúcia procurou Lamater, um amigo da faculdade e grande colega de trabalho.
– Meu amigo, que presente você me deu ontem! Fui dormir às quatro da madrugada e não vejo a hora de continuar a ler!
– Eu sabia que você gostaria... O que você está achando até agora?
– Maravilhoso! Estou começando a encontrar algumas respostas para meus problemas. Acho que consigo terminar a leitura hoje e amanhã quero conversar com você, tudo bem?
– Claro! Será uma honra! E na próxima semana eu lhe emprestarei outro livro do mesmo autor, dessa vez abordando o gerenciamento de projetos.
– Mal posso esperar! Mais uma vez, obrigada, amigo!





O que foi que nossos dois personagens descobriram que os deixaram entusiasmados? O que um físico, educador e filósofo israelense pode ensinar sobre administração, melhoria de processos e resolução de conflitos? Muito!
Eliyahu Moshe Goldratt provocou uma evolução no pensamento gerencial no mundo todo, quando lançou seu livro “A Meta” em 1984, explicando sua “Teoria das Restrições” (TOC – Theory of Constraints). Primeiro por seu estilo: uma novela gerencial. Nada de um manual chato, cheio de definições, teoremas, corolários, referências bibliográficas e citações.
Segundo, por suas idéias, entre as quais destaco as seguintes:

1) Ótimos locais não garantem o ótimo global
O senso comum diz que se cada um garantir seu desempenho máximo, conseguiremos um desempenho total máximo também. Essa conclusão é desafiada quando se leva em consideração as variações estatísticas de cada elo da corrente. Quando se faz a sobreposição de todas as contribuições individuais é que percebemos que nem todos estão “remando na mesma direção”, ou conseguem “remar no mesmo ritmo”. Embora todos estejam “dando o máximo de si”, nem sempre o sistema tem seu rendimento maximizado. É só observar ao seu redor...

2) Gerenciamento não tanto por custos, mas também por ganho (throughput)
Outra “vaca sagrada” que foi imolada por Goldratt é a idéia de que o gerenciamento dos custos é um dos principais fatores para conseguirmos maiores lucros. Essa noção até pode ser adequada em determinados contextos, mas de acordo com o item 1) acima, um ótimo local com relação aos custos não garante o ótimo global com relação ao lucro. O foco no rendimento global do sistema pode resultar em ganhos muito maiores do que aqueles oferecidos pelo simples controle de custos.

3) Em um determinado período, qualquer sistema possui uma restrição (gargalo) que o impede de atingir um rendimento maior
Pense bem: O que impede sua empresa hoje de vender mais? Por que sua fábrica de software não consegue entregar produtos mais rapidamente? A primeira reação é pensar num monte de motivos. Mas se começarmos a colocar esses motivos numa forma de relacionamento de causa-e-efeito, certamente descobriremos que no máximo dois deles podem ser apontados como as principais restrições (ou gargalos), e na maioria dos casos há apenas uma restrição que, se eliminada, impactará direta e positivamente no rendimento do processo.
É justamente para eliminar essa restrição que os esforços devem ser direcionados, seguindo um processo de cinco passos:
  1. Identificar a restrição
  2. Decidir como proteger o componente restritivo, para que não fique subutilizado e seja explorado ao máximo
  3. Submeter o ritmo do sistema ao ritmo dessa restrição
  4. Elevar o componente restritivo
  5. Se a restrição foi quebrada, voltar ao passo 1, mas não deixe que a inércia gere uma restrição no sistema!
Podemos (e até devemos) aplicar esse processo de melhoria em qualquer área da nossa própria vida e em qualquer processo produtivo.

4) Resolver conflitos não implica, necessariamente, em fazer concessões
Quando há um conflito, nem sempre a melhor solução é conseguida com ambas as partes cedendo um pouquinho para chegarem a um consenso. Quando um dos lados faz concessões, temos uma situação ganha-perde, que pode rapidamente se deteriorar em uma situação perde-perde.
Para resolver, ou melhor, eliminar o conflito o primeiro passo é especificar o problema de forma objetiva, sob o ponto de vista dos dois lados envolvidos. Uma das ferramentas propostas para ajudar na especificação do conflito é a “Evaporação de Nuvens”.

Exemplo: um dos principais problemas na gerência de projetos é equilibrar as três principais variáveis - prazo, custo e escopo - sem abrir mão da qualidade, claro. Segundo modelos popularmente aceitos, como o PMBOK, um projeto é considerado como sucesso se conseguiu entregar o produto especificado dentro do prazo e orçamento definidos, satisfazendo ou até mesmo superando as expectativas do cliente.
O objetivo (terminar um projeto com sucesso) pressupõe que, pelo menos, dois requisitos sejam satisfeitos:
  • atender às expectativas do cliente, o que geralmente implica em aceitar alterações na especificação inicial;
  • honrar os compromissos de prazo e orçamento, para atender às expectativas da empresa executando o projeto, o que comumente exige que a especificação seja “congelada” ao máximo.
Colocando isso de forma gráfica temos:




O conflito geralmente ocorre entre as premissas ou vontades. Nesse caso, o gerente de projeto vive a tensão de permitir ou não alterações no escopo. Como resolver esse conflito? O senso comum diria que “permitir um pouquinho” e “dizer alguns nãos” seria uma “boa” solução, mas claramente não resolve o conflito e sim tenta agradar a “gregos e troianos”.
Para evaporar uma das nuvens conflitantes e assim, de fato, resolver o problema, necessita-se fazer “injeções” de premissas que quebrem a relação lógica com os requisitos/necessidades. Nesse exemplo, a premissa de “Não permitir alterações no escopo” pode ser uma conseqüência do ciclo de vida utilizado no processo, como por exemplo, o modelo em cascata (waterfall). A adoção de um processo iterativo de desenvolvimento pode eliminar essa “premissa” de não permitir alterações no escopo, evaporando essa nuvem e resolvendo o conflito.

Resumindo...
A Teoria das Restrições oferece fundamentos e ferramentas para ajudar na melhoria de processos, respondendo a quatro perguntas fundamentais:
  1. O que mudar?
  2. Para o que mudar?
  3. Como causar a mudança?
  4. O que trará a melhoria contínua do processo?
Ela está sendo aplicada com sucesso na manufatura, marketing, contabilidade, gerência de projetos, engenharia de software, vendas, educação, saúde, etc. Complementa muito bem outras iniciativas como gerenciamento da qualidade, CMMI, Seis Sigma, PMBOK, entre outras. Pessoalmente eu a uso também para resolver problemas pessoais, familiares e profissionais! Até meus filhos aprenderam a usá-la no dia-a-dia!
Para saber mais leia “A Meta” e outros livros do Dr. Goldratt, de acordo com o interesse e área de aplicação. Eu recomendo ler todos, se o tempo permitir! O site oficial é http://www.goldratt.com/. Boa melhoria e até a próxima!





Sobre o Autor
Adail Muniz Retamal é engenheiro eletrônico por formação, mas engenheiro de software por opção. A pesquisa e o ensino o levaram a buscar, em diversas áreas do conhecimento, pontos de vista por vezes antagônicos, mas que possibilitaram extrair conclusões valiosas. A Teoria das Restrições encaixou-se perfeitamente neste contexto e, desde então, passou a estudar, aplicar e disseminar essa proposta em suas palestras e cursos. Adail é o Diretor de Tecnologia da Heptagon.

Fonte: http://www.heptagon.com.br/intro-toc

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